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NINGUÉM CONHECE O POVO


O povo está adormecido?
Não, o povo tá aí todos os dias na rua
Buscando a sobrevivência
Diante da eloquência daqueles que tem tempo de ir às ruas
O povo não vai as ruas
Porque há horário a cumprir
Caso o patrão libere, há muito roupa para estender
Pois o povo trabalha 24h por dia
E ainda aguenta a palavra brusca de quem se acha sempre na melhor



O povo não adormeceu,
finge de adormecido.
Até que não consegue mais desfingir
O povo é um poeta
Que não entra na academia
E nem sequer deita na grama da universidade.



A opressão é um camarada estudado
Que se acha melhor do que o povo.
A opressão é uma patroa
Que não permite que ele use o mesmo copo ou coma a mesma comida
A opressão é um professor
Que preza muito mais o silêncio
Cadavérico de quem é ensinado
Do que a agitação das ideias



O povo está sem aldeia
E tem suas crianças mutiladas pelos que cortam suas árvores
E que move a economia nacional.
O importante é um móvel legitimo de madeira
Feita pela faca branca que degola
Criança enquanto mama.


O povo tá acostumado a ser revistado,
A ter sempre aquele olhar de desconfiança
Da viatura quando decide cortar caminho pelo condomínio
Para chegar a favela.



O povo rir
Mesmo diante de tantos problemas
Sabe discuti sobre política
Em sua língua
Nada acadêmica



O povo debocha
Quando os pesquisadores vão lhe pesquisar
Sente-se importante
Mas também sente o  desânimo:
 cada dia é um pesquisador diferente
Ao invés de humano diferente
Que soube e desce os morros.



O povo tem sangue no olho
Mas sempre foi contido
Pelas violências diárias
De quem usa botina
Terno ou salto.



O povo anda de pés descalços em tempos de folga;
Come frango com a mão;
Frequenta o buteco com os amigos.
O povo não é só da cidade
O povo conhece bem o coronelismo
De quem até partido tem.
Ninguém conhece o povo
Por isto nunca o viu dançar
E esquecer
De tudo que é imposto
E que dói



O povo é vivo
Deixa ele falar por si só,
No Brasil ninguém conhece o povo.
O povo é de Deus
e é de Oxalá e de todos os orixás

O povo acorda cedo
e em cada esquina cumprimenta os tantos pedaços de povo
e o povo não pode ser escrito
não cabe na letra
não se mede no ritmo 
O povo é povo
não fala de mais
porque quem fala demais 
ameace com a boca cheia de formigas 




                  Juliana Costa 22/10/2016 JF 

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