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Mostrando postagens de dezembro, 2016

O MUNDO ATÉ O OSSO

Tive um encontro infeliz com o senhor silêncio Não conseguir fugir fui penetrada com uma violência histórica que todos negam. Estou ferida, mas não estou morta O senhor silêncio colocou em minha boca uma máscara não me era permitido um sussurro. A palavra sufocada não produzia revolução Considerava a minha mente sua plantação Aquele branco senhor não manifestava nenhuma dó Não sei por quando tempo Não sei quantos serão os estragos que o silêncio me fará Para quem está acostumado a falar o silêncio é um senhor bom Estarei vivendo com alma inquieta remoendo os dizeres adulterados . Já cansei de gritar, não adianta todos os ouvidos estão tampados pelos interesses individuais Todos os olhos estão cegos, olhos branco... que mesmo quando ver agem como que nada vissem Meu corpo foi transformado em um porão Onde que tenho que está contida a espera de uma nova era em que pessoas negras sejam de fato ouvidas ao invés de serem mortas de todas as formas co

ONDE ESTARÁ MINHA PAZ?

Minha paz era um menino pretinho brincando na rua e que colecionava pedras, dando-as a necessária preciosidade. Ainda, que fazia das poças d'águas, formadas pela chuva da noite anterior, um mar onde era marinheiro Minha paz corria descalço somava seu riso com outros tantos risos quando alguém perdia a brincadeira Minha paz, bom menino. Sem saber era poeta Fazia da realidade um mundo em que podia ser herói Não temia as ondas que brotavam daquela poça-mar Não temia as estrelas que do céu caia enquanto navegava Ah, não percebeu o repentino tiroteio seu mar ficou cheio de estrelas... Os risos se perdiam no deserto do silêncio Sua mãe corria para resguardar seu marinheiro Porém era tarde... o mar se transformou em sangue e nem sequer era um milagre. Juliana Costa  29/12/2016 JF/MG 

NOITE FELIZ

Noite feliz É quanto os moleques da favela Podem andar sossegados Sem que no outro dia para sua alma se acenda uma vela Noite feliz É quando ao nosso lado não dorme O medo ou raiva De ser sempre confundido Com algum suspeito da suspeita racista de algum fardado. Diz aí meu senhor Pelo amor ou pela dor Eu quero um Brasil diferente Não me importa onde tenha nascido aqui ou em Belém Só peço que não se esqueça Aqui no Brasil Roubam em seu nome Mas delatam até Barrabás Noite feliz Cada um com sua cruz em forma de pátria Quão afável é teu coração Que quisesse nascer nosso irmão E por isto foi criminalizado E seu corpo desaparecido Dissimularam a verdade Subiu aos céus, era culpado. Que se bata os sinos, mas por favor não soem as sirenes. Juliana Costa 23/12/2016 JF/MG

NERVOS À FLOR DA PELE

Quando os nervos Estiverem à Flor da pele Pare, Pense, Reflita. Até que o  adubo para essa flor Seja outra coisa Maior que Nervos. Juliana Costa

PERFORMANCE POÉTICA EM CURITIBA-PR

APANHO Apanho todos os dias Não é um apanhar de flores De pão De roupas apenas Apanho todos os dias Apanho, pois minha classe é destinada a apanhar. Cristo nos ensina: se baterem em uma face, vire a outra. Creio que Cristo aconselhou os oprimidos E estes como bons cristãos serviram-se do conselho eu também Apanho nos dois lados de minha cara... diariamente. Apanho, doutor Apanho sim Tudo que não querem e que eu não posso comprar Eu apanho Pois comida nenhuma é desperdiçada por quem tem fome Apanho, sim, professor Apanho por não querer ver tudo que vem de meu povo como o errado Apanho madame Recebo spray nos olhos Por isto fico a chorar de dor... de raiva... De preocupação querem dominar meu coração colocar meus sentimentos em senzalas. Apanho Apanho um porrete e não corro do combate chega de apanhar, se já não tenho mais medo da morte preciso ser forte Pois senão os senhores me levam para o abate. Juliana Costa In Cadernos Negros 37 (2014)

VAMOS FALAR DE AMOR?

Amar Mesmo sabendo que é perigoso É algo que dá gosto Amar é o risco Que todos nós corremos Amar é fazer rabiscos Querendo escrever algo para quem se ama Sem ter palavras suficientes para dizer Amar é incompatibilidade que dá certo É o efeito da repetição “ Eu te amo” Amar é um  arco-íris ligando o céu e a terra com um beijo Amar é mais que fogo que arde É frio no estômago quando se ama e não pode tocar O amor é a noite de conchinha com as lembranças Daquele amor que já se foi Amor ou Amora são coisas que sentimos na boca, Selamos com um ato. Quem nunca amou que jogue o primeiro beijo... Que colha a primeira flor. O amor que coisa louca Deixou de caminhar pelas ruas, Deixou de frequentar diariamente as redes sociais Não faz mestrado e muito menos doutorado, O amor nunca foi acadêmico. Amor é a morada De algo que só conhecemos quanto vivemos Sem esta de pares perfeitos ou casais ideais O Amor não é vendido por reais A

APENAS “ SUSPEITO”

Qual é o critério para esta definição – rótulo “suspeito”? Nesta sociedade que julga a pele negra como um defeito É possível enxergar o social preceito: Que escura é a cor da culpa. E na vida acadêmica confunde-nos com um quadro negro Em que um giz branquíssimo digita suas verdades, mas é tão branca a vaidade. Daqueles racistas que lecionam na faculdade “ Suspeita” acreditam ser nossa capacidade De raciocinar sobre aquelas teorias que tanto nos inferiorizam Daqueles conceitos – “verdades” que se naturalizam E se multiplicam venenosos em vários livros É tanto tiro na cara Na rua Na escola Ou na praça Retiram nossos direitos das sociais logísticas Enquanto pintamos as estatísticas Juliana Costa    2016 JF/MG 

LENDO O DILÚVIO

Que dilúvio é este que cai da noite? São Pedro, por favor, faça parar Xangô, Kao Kabiesilê, não deixa na dor ninguém perecer A pobreza anda nos becos a serviço de quem tem poder para mandar. A justiça e seu alto escalão Pensa que todo preto e pobre é ladrão, na escuridão tudo é alvo Nada é humano, tudo tem  a mesma justificativa “ É mais um bandido que podia matar um  pai de família” A dúvida se transforma em certeza quando o racismo anda fardado. Que dilúvio é este que cai da noite? É tanta água A dor em forma líquida  e as tantas mães que rezam, Enquanto o público  sempre condena: “ Se criasse direito, não teria morrido” “ Se tivesse dado educação, não estaria enterrando filho” E os filhos que matam outros filhos Chamam de heróis da nação Uma nação branca de ideias E coloridas nas ruas Que dilúvio é este que cai da noite? Cobre a favela e ninguém ver. Eu aqui lendo o dilúvio  como se ele brotasse de mim Juliana Costa 12/12/20

O RISO RAIOU

                                            dedico a Ana Paula Mendonça. Cada dia a gente se repensa repensa o porquê dos punhos erguidos E quando foi que eles se ergueram pela primeira vez Talvez, no ventre escuro de minha mãe meus punhos foram gerados E quando eu nasci, eles se ergueram tímidos rasgando o véu social que já me condenava. Depois no hostil cotidiano, os meus punhos se ergueram como poesia e como grito. De vez enquanto meus punhos ficam doloridos, parecem que eles erguem o mundo e os milhares de corpos negros executados pelas mãos brancas de quem nunca perdeu a paz ciente de que era dono de tudo o que os meus olhos tocam, dos nossos corpos e de nossa fala. De vez enquanto uma lágrima desce varrendo a face seca de quem retornou de um combate Depois de uma, vem incontáveis ... e um mar morto surgi no rosto. Antes do tempo amarrar a corda em nosso pescoço procurando uma boa árvore para nos pendurar em suas futilidades o riso raiava! e fazia do mar m

MEUS 312 MESES

Eu tenho 312 meses sou abord (t)ada todos os dias e você nem sequer manifesta um apoio textual nas suas redes ou entre seus amigos para que parem de me abortar. Eu tenho 312 meses e dois olhos vejo como uma criança assustada os 111 tiros os cinco corpos a se multiplicarem sem vida nas lembranças coletivas dos traumatizados por tanta chacina Eu tenho 312 meses E ainda tenho que explicar sobre coisas tão lógicas: " Privilégio" e o seu cinismo " Racismo" e seu ideal de democracia... Eu tenho 312 meses Sangro Sangro Sangro Sangro Sangro Enquanto você vira o rosto assistindo o jornal nacional. Eu tenho 312 meses Já vejo a naturalização da cultura do estupro, mas assumindo vítimas recém-nascidas e de Pais impunes. Não importa a idade que eu tenha nasce, viver ou morrer é sembre uma questão de poder E mesmo assim