COORDENADAS DE UM QUILOMBO

Eu lembro da senzala
 e dos meus pés pedindo autorização..
cabeças baixas
e o silêncio, ferro invisível na garganta,
que se era obrigada a fazer
para não despertar o sinhô
nem a sinhá.
Ai! se eu não me comportasse...
Era tronco.
Era sede.
Era fome.
Era eu.
Eu lembro da senzala
por que os sinhôres do meu tempo
ainda pensam que eu sou escrava.
Apesar de me tratarem com a  mesma desumanidade,
quando começo a adentrar seus lugares de privilégio
repleta de  meus inúmeros por quês.
Sentem na alma a mesma fúria histórica,
inexplicável,
mas histórica.
Exerço  com força
os meus atos de fala
e mesmo que me ofereçam, gentis, uma máscara de flandres
com as minhas medidas,
insisto em desagradar,
recusando - a.

Diante da minha audácia,
todos estes cidadãos de bem
perguntam-me:

- Onde está localizado o seu quilombo?

Eu respondo:

- Em um lugar que os sinhôres não foram convidados a entrar.

E violentos insistem:

- Mas nós temos o direito de saber, negra, se coloque em seu lugar.

E eu gentilmente insisto:

- Os sinhôres não tem direito em terra que não governam,
Meu quilombo, caminha comigo dia e noite, repleto de dúvidas e  com algumas certezas.
Ele me fornece poesias, enquanto o meu povo canta mesmo diante da dor.

O meu quilombo
é um território que
jamais alcançarão
nem mediante a violência.



Juliana Sankofa  17/06/2017 




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