BOCA DO CÉU

Sei que não cabe a mim dizer

o que anda me incomodando,

mas na falta de um porta- voz branco

Eu ousarei lhe dizer;

mesmo se preciso for eu responda as consequências...

Eu me pronunciarei...

Apesar de toda interdição.

Eu enunciarei...

embora tudo o que eu diga se distorça.

Já bem sei que as palavras

o seu medo filtra

antes mesmo de chegar ao ouvido,

entendo agora o por que da agressividade,

grande crime dos nervos

o qual transferi à mim

já que não é bom para você assumi

que me odeia só por eu existir

Sei que não posso falar

que meu silêncio me nomearia a "boca do céu"

mas, não se preocupe, a minha língua é igual a sua

Sei que prefere os meus sorrisos brancos de aceitação,

se eu não sorrir, não posso receber sua aprovação

de que eu sou uma mulher negra ideal

para receber o reconhecimento geral .

Se eu não sorrir

o dia se transformar em noite

entre calafrios

receberei ,repletos de gentilezas,

o seus açoites.

Sei que não é legal falar neste tom

de pele

de palavras

de sentimentos

Mas mana quando me pede o silêncio

Eu lhe pergunto por que se cala

Sei que nossos passos são diferentes

que embora seja a mesma mão que me bate

a que desferi socos em sua barriga

Não olhe por umbigo repleta de medo

Sua covardia a liberta de muitas coisas,

mas lhe aprisiona nas essenciais.

Eu sei que pela boca que eu tenho

muitas portas se fecharão.

Mas meus pés já deixaram de ser trêmulos,

firmes,

todas elas, eles abrirão.

Desculpe, não venho lhe cobrar nada

comigo não tem obrigação,

só tire a sua mão amiga da minha boca

se não luta também pela minha libertação.

Sim, estou repletas de mágoas

mesmo que injetam em mim constantes amnésias

o livro na mão

não me faz tão bem assim

Sou obrigada a ler palavras

que sobre mim não dizem nada

Sabe aquelas teorias

que nos impõe como verdades

Então, eu as domino muito bem...

Sabe aqueles e aquelas intelectuais negr@s

fico entusiasmada de lê-los

Embora ao erguer a cabeça eu lamenta

por não ter uma professora preta...

Embora já tive professores pretos

que na primeira constatação da minha insubordinação

esqueceram-se que são meus irmãos.

Eu sei que não deveria dizer estas coisas

Desculpe

eu sei que preferiria que fossem palavras - cruas

sem ideias ou intenções

Mas eu preciso lhe dizer

que supero os porões

todos os dias.

Juliana Costa 19/07/2017 JF/MG