Pular para o conteúdo principal

UMA MULHER COMO EU

Talvez uma mulher como eu
estivesse na cozinha do paraíso
preparando quitutes
e na hora de contar a história da criação
o Senhor dela se esqueceu,
relegou-a ao papel de rascunho
de um texto santo que não soube continuar.

Talvez nas narrativas nem tão santas
de uma história mal contada
Uma mulher como eu
estivesse organizando os papéis
limpando as penas
servindo chás
e que depois sorrindo dizia que era mulher também,
mas as companheiras não ouviam,
agradeciam os chás, as penas e os papéis
e gentilmente pedia que quando terminassem de escrever
que esta mulher como eu
limpasse tudo
para que o esposo não reclamasse.

Uma mulher exatamente como eu
sentada em um sala de aula
onde o quadro negro
era quase um semelhante.
Atenta, ouvia as teorias sobre mulheres
aprendendo que somos todas iguais
enquanto milhares de fotos de mulheres brancas
se projetavam na tela branca
cuja escuridão era necessária
para serem vistas.

Juliana Sankofa  JF/MG 02/10/2017 



*** imagem encontrada na internet e cuja autoria está se pesquisando.

Comentários

Postagens mais visitadas deste blog

AUTOSSABOTAGEM

É abafar o grito e forçar  um sorriso receptivo enquanto professa que somos todos iguais. É amarrar os próprios sonhos em uma âncora e lançá-los em profundo buraco. É ser visionário da desgraça Prever apenas os escombros do futuro e a dor É rasgar os próprios poemas, quebrar todos os lápis, queimar todas as folhas e explodir a caixa de energia de casa. Autossabotar É construir uma armadilha que captura apenas o interior É ter as próprias digitais no pescoço e ser a testemunha de acusação e o reú. É chorar e dizer que as lágrimas salgadas Não fazem arder as feridas É tropeçar no cadarço do sapato que não quis amarrar É entrar no rio sem saber nadar Ou se afogar mesmo sabendo. Sabotar é puxar o fio vermelho das ideias do inimigo. É escrever um poema Que mata, mas que não lhe suicida. Juliana Sankofa 12/07/2018

NOVA VIÇOSA

A memória caminha sorrindo, ferindo os pés nos paralelepípedos afiados das ruas... tropeça em galinhas, observa as rodas dos homens que não fixam os olhos em seu rebolar. Esquecidas as feridas das pedras, a poeira das ruas de terra não desgruda de toda a memória. Os risos brincam de pique-esconde com as dores Cães e gatos caminham paralelamente na mesma rota. Se o sol não brilhar no céu, brilha intensamente nos olhos De quem ver beleza até no dia cinzento de domingo. A memória percorre o bairro Proseia com a esperança Carrega no colo a alegria Descansa sentada na calçada Escuta o canto da rosa, Sente o cheiro-gosto do café ... continua a caminhar. Passos de quem não sabe para onde vai ... mas se move sem pressa, dançante... colhe as histórias. Enquanto isto ... A senhora mais velha do bairro Nunca compreendeu o porquê da memória nunca envelhecer, Ofereceu-lhe um copo de àgua Olhou os pés sujos e machucados e nos lábios o lindo sorriso faz contraponto. Pergunta-lhe o nome: Memória de
A Maré não está para peixe Nem pra preto O anzol é o Estado A bala também. Que passado é este  que não deixa de ser passado para nós?