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Mostrando postagens de outubro, 2023
  Abra o caminho em silêncio não fale por mim, não diga sobre mim não me estude se não for capaz de colocar em pauta os seus privilégios com a mesma força que quer falar sobre quem não é. A intelectualidade é vasta, Pode-se pensar sobre o mundo, sobre tudo e sobre todos. Meu corpo não deslegitima o seu saber, porém, por que o seu deslegitima o meu? Só queria dizer que eu estou cansada de todos os seus pactos, dos seus falsos discursos da sua pouca prática por mudança social É cômodo viver nesse caos, em que sua voz é escutada enquanto milhares iguais às minhas são silenciadas. Eu sei quem é você entre os iguais, Se não dói na sua pele, nem se manifesta Está escrito na sua testa: que me prefere objeto ao invés de sujeito Não importa como me chama: querida, amiga ou flor Eu sinto horror desse corpo que não se olha, por medo de ver os próprios traços, morais e físicos que oficializou o genocídio, o epistemicídio e o mentecídio de pessoas como eu Juliana Sankofa Link da imagem/fonte: pinte
Sorriem, eu sorrio de volta. Cativam-me em prol de dominar Eu cativo de volta afetos, No susto percebem, que eu sou a ferrugem ácida das correntes de quem se camufla na sombra de minha identidade. Deixo que se aproximem, meu corpo-medusa quer brincar de escravo de Jó com suas entranhas de pedra. Juliana Sankofa Link da imagem:https://pin.it/57ek8rx (pinterest)  
  Noturna, Estou em casa. Em todos os lugares, o opressor dorme embalado pela própria ilusão de bondade. Amanhã, quando bater a porta dos meus olhos a claridade de mais um dia Falarei do óbvio e quebrarei as lentes do Panóptico Abraçarei quem eu amo Ligarei para minhas mães a fim de ser embalada pelas vozes que me cicatrizam todas as feridas das batalhas da arena discursiva do pensar. Prometo a mim, Que eu não ficarei sem ar, vou me esperançar enquanto ainda escrevo Meu ser sangra pelo verso, minhas grandes ondas estão no avesso do que é visível. Deus me livre dessa preta arte do sensível, abolindo minha fé de que palavras bonitas mudam almas horrendas Ó senhor, meu corpo não é sua oferenda Não tenho nada a oferecer nem mesmo esse poema mas lhe peço: apague as estrelas, apague todas as velas, apague todo racista que tem medo de cara preta Amém. Juliana Sankofa Link: https://pin.it/7xw4hHk
 
  Não estou a serviço, nem nasci a passeio. Vivo carrego no peito tantos anseios e nenhum mapa que me leve para um território em que a paz seja da minha cor. Não estou a serviço, nem nasci a passeio no meu corpo é o meu primeiro paradeiro Não me machuque, Não me subjugue, Não me domestique. Não me escravize! Quando os olhos veem, chama-me “amiga” No entanto, no privado das relações honra o privilégio da alva pele que eu chego a pensar que toda sinhá é marxista Não estou a serviço, nem a passeio escrevo metáforas enquanto silenciam-me para que eu não diga, na minha perspectiva, uma verdade mais coesa que a sua. Não estou a serviço, nem a passeio Sorrio, com o abismo na boca em forma de diastema. Juliana Sankofa Link da imagem:https://pin.it/20E4gwe (pinterest)

POEMA DE MEIO-DIA NUMA NOITE ESCURA

Fui a primeira Nem por isso sou a melhor e nem a pior do que aquelas que não foram Fui a primeira da minha família a ser professora Fui a primeira da minha família a ser chamada mestre Fui a primeira a ser chamada escritora Fui a primeira a ser doutoranda Não fui a primeira a superar os meus traumas Nem a primeira a procurar tratá-los Mas eu fui a primeira em tantas coisas que sai puxando quem não pode ser a primeira. Fui a primeira Por isso, ser humano algum tem o direito de me fazer sentir como se eu fosse a última a última a ser respeitada a última a ser considerada a última a ser amada a última a ser ouvida Sempre fui a última a chorar Hoje, luto para ser a primeira Quem sabe assim reconheçam a minha estranha humanidade. Juliana Sankofa fonte da imagem: @ufabizphoto
                                          Dedico a Simone Maria de Moraes, um dos amores de minha vida.  Não importa quantos anos vivamos, Somos os únicos habitantes do nosso mundo-corpo Abra as frestas para o sentir,  para revolta e para o encontro de mundos, sem que seja um apocalipse.  Não permita que as rachaduras na parede de sua infância, Sejam as de sua alma Lembre-se que o amor é nossa política mais recente de autorreparação  Pretinha, seus tons de luas  Às vezes, aumentam minhas marés Sem fé no ontem, no hoje e no depois, eu vivo navegando-me  em prol de me encontrar  em uma ilha sem Sexta-feira.  Chore Chore Não construa arca nenhuma,  chore deixe afundar o que é preciso. Na madrugada,  eu lhe pressinto  de cá, do meu mundo imergido de tantas questões e muitos dizeres. Quebre as âncoras dos olhos, eu lhe vejo Juliana Sankofa Imagem: https://pin.it/3jF07c7 (pintereste)
  Dedico a Bruna Martins É preciso colo para desanuviar o peito... A vida é cheia de demandas, exigindo projetos para o futuro, sem tempo para lidar com as dores do presente que nunca viram passado A sobrevivência é a escrava do capitalismo Sem dinheiro, sem carisma para alguns o mundo é um lugar tão lindo Para nós, um limbo de gemidos abafados e poucos abraços Se nós pararmos quem irá ser o nosso refúgio? sem ou com pouco privilégio quem me dará banho e o que de comer quando não tivermos mais força? O mundo parece brincar comigo de forca todo dia o sol nasce eu mandigo esperanças em minha alma e retiro a determinação da fossa. Ah, meu desprezo só aumenta por essa gente que transforma minha dor em bossa nova. Juliana Sankofa fonte da imagem: pinterest (https://pin.it/7N0PfIB)
                Dedico a Catarina. Indomável, sensível ao sopro do vento, ao som das águas, aos detalhes do céu, ao outro que se aproxima. Sorrir com os olhos, a voz de timbre gentil não muda o tom quando está brava E sua braveza se desperta diante da injustiça, do bizarro e do contestável Branquinha é uma ovelha negra na academia. Minha semelhante Que não oculta o semblante diante da ignorância do superficial Eu lhe convido para a dança em que meus pés levantam poeiras coloniais escondidas debaixo dos carpetes e eu entoo um canto de resistência que lhe abraça nas suas lutas. No caos deste nítido mundo, eu sou a escura poesia. Juliana Sankofa (4 jun 2023) Fonte da imagem: pinterest
  A branquitude ama o Cânone porque Ele não se parece comigo O Cânone não tem pele, não tem cabelo não tem nariz e finge ser "todo mundo". A branquitude ama o Cânone porque Ele não se parece comigo Ele urina de pé ignorando a realidade não por talento e sim pelo medo de ver a escuridão nos cantos do Brasil A branquitude ama o Cânone porque Ele não se parece comigo O Cânone já levantou a chibata O Cânone é puro Engenho O Cânone não entendeu o Machado Afiado em Lima, escondeu o pioneirismo de Maria O Cânone criou sombras, direcionou o clarão e definiu entre si quem tinha o mesmo sangue semiótico para se sentar a mesa nos chás nas terças-feiras. Eu sinto raiva do Cânone e Ele sente raiva de mim. O Cânone não é Universal é imposto. Juliana Sankofa Imagem: escritora Carolina Maria de Jesus Fonte: pinterest
  Afasto-me de espaços onde meu corpo é saqueado, mais do que escutado. Não me encaixo desabo-me em escombros toda vez que sou silenciada, desvalorizada. Estou na fronteira, longe dos domínios esbranquiçados do poder erguendo uma bandeira única: a minha voz que é também subjetiva. Eu nunca fui escrava Juliana Sankofa                                                 Fonte da imagem: Pinterest Artista:Nkem Odeh-ifeyinwa
Se me demonizam, Eu, a Diaba, gargalho diante do caos Brinco de escurecer a nitidez do absurdo de quem diz que ensina, quando machuca, desorientando-me para que eu não alcance os seus privilégios: de não serem a cor do pecado, de não ser o marginalizado de não ter seus filhos arrancados do mundo, sem tempo para se despedir. Eu, a Diaba, finjo e finjo e mesmo sendo poeta a minha dor não vira poesia a ser lida nas universidades Ah, o meu corpo sobreviveu ao “descobrimento” e vem suportando o descumprimento de quem jurou ensinar, mas quer escravizar. Eu, a Diaba, leio reescrevo padeço Quem dera eu tivesse a força de retroceder a rotação da terra E não estar aqui neste lugar que não é meu, Mas que me quer sua não como pensante-sujeito, E sim como objeto- decrépito que sustenta lavouras inteiras de egos de algodão. Juliana Sankofa fonte: acervo pessoal (2023)