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Mostrando postagens de 2018
Quilombo-me Logo Existo. Juliana Sankofa
·   De mim Só sabem o mínimo E do pouco que conhecem Julgam-me ao máximo Não sabe que sou o resultado De lágrimas , risos, lutas e fracassos Já quis desistir Mas o amor disse: Não me mate! Juliana Sankofa ( nome artistico de Juliana Costa) 08/12/2018 

HISTÓRIA SILENCIOSA DO BRASIL

Vivo em um país tropical Que idolatra peles-neves. As histórias de ninar são sobre a nobreza das sinhás e da belezas dos homens brancos montados em seus cavalos branquíssimos. Aqui as crianças tem um medo crônico do escuro... Quando crescem, não sabem distinguir o medo do ódio. No meu país adultos medrosos cheios de ódio governam e ensinam Enquanto queimam pensamentos- Recifes Instauram a anti-pedagogia nordestina. O privilégio deixou o quadro negro triste cinza e da escola pública uma guilhotina que educa. E a fome pobre Lázaro foi ressuscitada pelos jesuítas carismáticos imperialistas grandes pregadores da carochinha e devotos do dízimo. O milagre nesta terra sempre ocorre Vive-se 1964 com os hábitos de 1500 Respeitando a democracia do branco e legalizando a chacina. Eu vivo em uma pátria arrastada e metralhada por 111 tiros. Culturalmente, Ao invés de saudar as ondas, Atiram quatro vezes no rosto da Maré.   Juliana Sa

PESADELO

Observo as pessoas com suas condutas ditas naturais e com justiça vencida  numa sociedade cujo sol é o cifrão. Sinto na pele o arrepio, Único e intransponível Vejo a bandeira desbotada de ideologias e com respingos de genocídio que o mais caro dos alvejantes tentou ocultar. Ouço uma multidão de gritos Historicamente ilegíveis As mesmas mãos que aplaudiram os corpos negros linchados, Também pelo fogo. São idênticas as mãos que queimaram sutiãs e que assinaram as leis. A realidade é luz apagada E eu preciso dormir. Juliana Costa  17/10/2018 Rio de Janeiro / RJ 

BALAS SEMPRE SELETIVAS

O ódio sai às ruas e diante da resistência negra nenhum tribunal branco julgará como legitima defesa. As balas seletivas nunca erram o alvo. Se o corpo é branco a bala é de borracha Se o corpo é negro bala puro chumbo, vozes apagadas. Se o alvo é preto a plateia é branca. Uma história de governos brancos e vozes roubadas. O populismo do branco é  o racismo sorrindo. Para nós, Sempre foi tempo de resistir... A resistência negra  nunca foi provisória. Juliana Costa  Rio de Janeiro - RJ  14/10/2018

SEM NOVIDADES

A lógica é simples: O racista de ontem, É o fascista de hoje Que continua racista, mas sem sutileza alguma. Para o branco o medo diário é novidade, A angústia fica entalada no pescoço Impedindo a respiração... “Oh, meu Deus, destruíram a democracia!”   Lá nas favelas a mesma nem subia, as lágrimas mães-pretas   já diziam: “Meu filho só errou em nascer preto”. O medo preto cês nem entendiam Viam   policial como símbolo budista, Namastê! Se invadem os barracos é preciso abaixar a cabeça pra evitar o esculacho. “Neguinho, ver se não me encara”. Fecham- se os olhos Antes um olho roxo ou os dois Do que nunca mais abri-los. Bala perdida não atrapalha yoga de branquim Mas encontram o corpo do neguim. Já que   rosas em mãos negras   são vistas como   dinamites E guarda-chuvas   como fuzis. Juliana Sankofa 13/10/2018  Rio de Janeiro - RJ 

A PRÓXIMA ENCRUZILHADA

    Eu tive um pesadelo bem sinistro. O coiso foi eleito presidente, um caos reinou no país. Gente preta morrendo aos montes devido à violência do Estado... Ops, não, isto era antes do Coiso ser eleito, confundi. Mas lembrando do sonho, o inferno social, racismo não ficou mais na esfera da sutileza, legalizado, todo mundo colocou os seus sinhôres à luz do nosso século. Corpos negros foram os primeiros a desaparecer, mas a ênfase social sempre foi nos corpos brancos desaparecidos, pois de alguma forma fizeram falta. Foram extintas as cotas raciais que brancos fraudavam e privatizou-se o ensino superior, mas mesmo assim o branco pobre entrava, já que o problema da sociedade não é racial, é de classe. Acordei, calafrios e uma cabeça dolorida . Depois de tanta coisa horrível, resolvi dormi novamente, refiz os cantos, preces para alguns.      E tive um sonho muito lindo, o Coiso não foi eleito. Mas algo do pesadelo se manteve, as pessoas pretas morrendo aos montes devido à violência do

É PRECISO TER CIÊNCIA

Eu sou a fórmula não usada e o poema cujo sentido não compreende. Sou a molécula do corpo que não considera, mas o mata. Sou o elemento que não se usa na regra de três, Aquela cartase dolorida que nos seus livros de teoria Classifica como violenta. Eu sou enunciação cujo signo é preto Sou o discurso que  você dissimula, não interpreta. Sua semântica não me explica ... silencia. Não ouse me colocar em suas entrelinhas Sinto prazer no tremular das certezas Sobre minha pele preta. Minha mente é um quilombo E uma aldeia que não se come brancos. Juliana Sankofa  27/09/2018

MEUS OLHOS PROVOCAM SINAPSES ESCURAS

Meus fios crespos completam as sinapses Olhos atentos ao mundo que não me olha no olho. A cada esquina um motivo pra pensar, embora as horas   brinquem   com as urgências ... É muito livro pra ler, Mas é maior é tempo para   trabalhar Só para garantir o mínimo de tudo, enquanto   seja máximo o sutil desprezo do eterno possível empregador ao dizer sorrindo que   é claro o requisito o qual só alguns   podem cumprir. Não importa o tanto de livros que se leia Por que toda ideia coerente deve ser clara? Juliana Sankofa 19/09/2018 Viçosa-MG

CANTIGA PARA O AMOR

A minha raiva é fogo que arde sem   se ver é um poema distorcido para satisfazer quem só reconhece o racismo reverso. É muito cômodo propor o afeto quando a mira social não está na sua cabeça. A minha raiva não lhe abraça E não lhe beija. Ela apenas tira do debaixo do tapete a diferença que você transformou em insignificante detalhe. De vez enquanto a minha raiva se faz extremamente sorridente “Preto bom é aquele que mostra os dentes” Minha raiva tem voz suave e respeitosa diante desses racistas genorosos que amam falar sobre nós enquanto   no silenciam com inúmeros nós brancos na garganta. A minha raiva é como uma cicatriz na garganta cuja dor ainda me assombra. A minha raiva odeia o privilégio do amor Ela é fofa Despedaça-lhe por dentro Enquanto canta uma canção Para lhe ninar. Juliana Sankofa  12/09/2018 Viçosa-MG 

TRAÇOS E ESTILHAÇOS

Deixa eu me despedaçar Com a potência do grito Que eu preciso dar Não sou uma mulher idealizada pelos românticos. Saiba também que meu corpo não é cortiço de ninguém. E meu ventre não é rasgável . Deixe eu me despedaçar Com os meus cacos eu corto os seus pulsos Ou escrevo um poema? Juliana Sankofa 29/08/2018  Viçosa-MG

NÃO SE ESQUEÇA

Acorde Lave o rosto Não deixe a lágrima mudar o gosto do café Ou embaçar o sol pela manhã Quem morre nos causa saudade Ou um outro tipo de morte? Se o peito doer mais do que normal Libere-se da culpa De não ter dado todos os abraços Bem apertados. Ah... Só morre de verdade Quem a gente esquece... Juliana Sankofa  06/08/2018 JF/MG

QUANDO IKÚ CHEGAR

Se eu morrer Não chore Cante Dance Brigue, Mas não chore. Minhas ideias fortalecem, porém não sabem qual é  o peso de pensá-las... Pensamentos são agulhas E nem todo mundo tem tempo de aprender acupuntura. Eu detesto o gosto da paz vendida em frascos pelas indústrias   farmacêuticas. Faz parte da vida morrer várias vezes E depois de cansado Morrer de vez? Quando Ikú chegar Vou sem dá desculpas.  Juliana Sankofa 03/08/2018

"BUCETA"! SOU UMA MULHER.

Não sou mulher de gestos delicados, As mesmas mãos que colhem flores, Podem dá socos. A boca que beija Também morde e grita, pronta para luta. Os braços que se juntam para o abraço, não suportam o aviso “Mãos para o alto” Que lá vem o Estado. Ninguém abre as portas Para que eu passe, Puxam a cadeira só para eu não me sentar... Mas me exigem tanta delicadeza na forma como   eu reajo ao mundo Sim, eu decidir exercer   minha “meiguice de mulher” que mulheres brancas não querem, porém me   exigem Com mãos leves eu puxo o gatilho miro atiro E sigo. ... as portas irão se abrir na delicadeza do meu chute, Pois sou uma mulher. Juliana Sankofa 01/08/2018

NEGRAÇÕES

Não limparei as bibliotecas mofadas dos brancos  Não apontarei seus lápis, nem organizarei suas canetas  No papel branco desenharei flores negras cujos espinhos não são maiores que as pétalas Não ensinarei  teorias brandas  e muito menos brancas... Rabiscarei no quadro negro  o peso da mordaça histórica  que nos impuseram. Seleciono as palavras soterradas pelos silêncios Digo em voz mansa as desgraças que o privilégio dos  outros provocam em nós.  Não me peça para sorrir, Transforme água em vinho, mas não transforme seu medo em violência  Minha voz firme  faz tremer os seus pés. Não engulo o seu feminismo cheio de ondas  que só reconhece Iemanjá se for branca.  Juliana Sankofa 29/07/2018 Viçosa- MG 

MANDINGA NA LÍNGUA

O racismo é coisa da nossa cabeça? O chicote nunca foi transparente, sempre branco... aliás branquíssimo. E quando o erguem Querem que acreditemos que se tratar de buquê de Flores? Mas é preciso superar o passado cujas flores feriram as costas daqueles que a violência  transformou os  negros corpos  em objetos sem almas e irracionais. É preciso salgar esta nossa memória coletiva, Rir do racista que se acham dono da mandinga E recusar levantar a bandeira branca  nas nossas revoluções. Que democracia é esta que transformou genocídio em costume? A mandiga está na ponta da língua Que poesia! Os destroços dos sentidos de quem achou que nos colonizou. Juliana Costa 27/07/2018

A CASA SEM PAREDES BRANCAS

Quero um teto apenas meu E, por favor, que as paredes Não estejam pintadas de branco E que seja proibida a frase “O homem da casa” . A casa será o ventre gerando minhas esperanças fornecendo uma outra infância E quem bater a porta ao perguntar pela a senhora branca dona da casa apenas eu direi: "Está morta no sotão, quer deixar recado?" Soltarei risadas de menina travessa embora os anos tenham deixado cicatrizas nos olhos Dançarei, mesmo que seja sozinha ao som de Aretha Franklin Chamarei a liberdade para tomar uma taça de vinho comigo... enquanto a resistência também velhinha contempla sorridente tudo. O quintal será enorme Sem flores, apenas uma árvore da fruta que eu mais gosto. Será uma casa repleta de gatos e de livros De risadas e palavras A história brotará dos seus quatros cantos E quando eu morrer O velório será na sala de estar Com as portas abertas para a eternidade. E as lágrimas da saudade virão até mesmo de desconhecidos... Não deixarei herdeiros Sinto

JUIZ DE FORA EM LENTE PRETA

Um labirinto central de indiferença. Em cada esquina um esquecido da sociedade que troca o dia pela noite por que na luz do dia o mal se ameniza: Ao invés de surras recebe-se  os nãos e  um humano  “sai daqui seu vagabundo”. A loucura se aquece no frio do central labirinto... Na praça da estação é onde os sentimentos se encontram tudo em harmonia Ou é riso ou é cansaço. Nos trilhos é o minério que encontra a luz no fim do túnel, o aço rugindo interrompe a presa de quem faz do ferro um ponto de passagem. Os morros gigantes reduzidos pela geografia do poder Nessa cidade repleta de nomes de Santos os demônios são sutis. Há também anjos de pedra guardando a encruzilhada da cidade, um transeunte de pés dopados perpassa silencioso as marcas esportivas e de solas confortáveis. As esquinas  exalam a silenciada história,  Homens brancos se tornaram nomes de ruas A avenida cheia de ruídos Lembranças da tragédia ocorrida no dia anterior, a rua sempre foi a Santa C
A Maré não está para peixe Nem pra preto O anzol é o Estado A bala também. Que passado é este  que não deixa de ser passado para nós? 

AUTOSSABOTAGEM

É abafar o grito e forçar  um sorriso receptivo enquanto professa que somos todos iguais. É amarrar os próprios sonhos em uma âncora e lançá-los em profundo buraco. É ser visionário da desgraça Prever apenas os escombros do futuro e a dor É rasgar os próprios poemas, quebrar todos os lápis, queimar todas as folhas e explodir a caixa de energia de casa. Autossabotar É construir uma armadilha que captura apenas o interior É ter as próprias digitais no pescoço e ser a testemunha de acusação e o reú. É chorar e dizer que as lágrimas salgadas Não fazem arder as feridas É tropeçar no cadarço do sapato que não quis amarrar É entrar no rio sem saber nadar Ou se afogar mesmo sabendo. Sabotar é puxar o fio vermelho das ideias do inimigo. É escrever um poema Que mata, mas que não lhe suicida. Juliana Sankofa 12/07/2018

FLORESTA DE PARENTESCOS

                                                            Dedicado a minha prima Graça Floresta. O tempo enraizado nos cabelos que se recusam a se desbotar. As lágrimas estancadas na face Enquanto as lembranças     provocam lapsos de sorrisos. Saudade é o amor envelhecido É lembrar da chama mesmo vendo a vela apagada. É sentir o abraço quando os braços estão distantes É sorrir quando o motivo ficou no passado. É no tempo que descobrimos nossos parentescos a partir das veias das vidas e no encontro do olhar. Primamos palavras e gestos e o tempo nos reforça os sentidos somos sem dúvida uma floresta de parentescos. Juliana Costa 09/07/2018